Resultado de estudo desenvolvido no MPPS/Cesmac evidencia a existência de “acumuladores de animais” em Maceió

Pesquisa aponta falta de política pública no controle das populações de cães e gatos, além da falta de educação ambiental para tutores desses animais

14/04/2021 às 10h02

Um inquérito epidemiológico realizado com 400 pessoas criadoras de cães e gatos na cidade de Maceió, revelou que 72,75% costumavam abrigar animais das ruas nas residências. Nesse universo, foi observada a presença expressiva de “acumuladores de felinos”, sendo verificada a existência de 10 a 75 animais criados com deficiência de orientação médico veterinário.
A pesquisa também verificou que, dentre as justificativas para o não acompanhamento de profissional dessa área aos animais, os “acumuladores” alegaram falta de condições financeiras e de não acreditarem ser necessária a orientação. A falta de pretensão para a tutoria permanente dos animais, também foi justificada para a realidade encontrada.
O inquérito epidemiológico integrou a pesquisa de mestrado da médica veterinária Evelynne Hildegard Marques de Melo e teve como objetivo investigar “O nível de cuidados básicos destinados aos caninos e felinos pelos seus tutores e a relação de risco zoonótico no município de Maceió-AL”. A pesquisa, realizada em ambiente reservado, investigou 31 pontos relativos à criação de cães e gatos, com destaque para “o hábito de resgatar animais da via pública e criar em residência”, o que evidenciou o comportamento de “acúmulo de animais”.
Durante a realização do trabalho observou-se que a maioria dos acumuladores não tem ocupação formal. O desconforto emocional ao falar sobre o número de animais acumulados, foi uma constante entre os entrevistados. Segundo a pesquisadora, “os acumuladores de animais são uma população que necessita de intervenção multidisciplinar para tratamento desse transtorno e orientação sobre zoonoses”. 

Evelynne é egressa do curso de Medicina Veterinária da Universidade Federal de Alagoas e colaboradora/consultora voluntária do Grupo de Extensão de Educação Ambiental sobre Cuidados com Cães e Gatos, conhecido como PetCidadão, coordenado pela professora Márcia Notomi. Com atuação em medicina veterinária preventiva, tem linha de pesquisa focada nos aspectos ligados às necessidades de políticas públicas relativas à presença desordenada de cães e gatos no centro urbano.
Segundo a pesquisadora, “considera-se ‘acumulador de animais’, o indivíduo que mantém dezenas ou centenas de animais em condições inadequadas e não percebe isso como um problema. “O acumulador é uma síndrome: união de fatores comportamentais que resultam em problemas sanitários e comprometem o bem-estar dos animais, da própria pessoa que acumula e dos vizinhos”. São pessoas que precisam de amparo psicossocial. Foram identificados muitos comportamentos de angústia pessoal nos entrevistados acumuladores. As pessoas facilmente choravam quando perguntadas sobre a quantidade de animais que mantinham em casa”, explica.
Nos desabafos, existe exclusão familiar, pressão da vizinhança pelo incômodo com os animais, isolamento social e sofrimento por não conseguirem dizer “não” aos pedidos de outras pessoas que levam cães e gatos para as suas residências.
De modo geral, “os acumuladores” são pessoas que adquirem muitos objetos ou animais sem um propósito aparente, perdem a noção de espaço, expressam descuido pessoal com as coisas ou animais que acumula. “Essas pessoas são conceituadas popularmente como meras apaixonadas por cães e gatos. No entanto, trata-se de transtorno mental e com sérios impactos na saúde única que é a interação entre saúde animal, saúde humana e saúde ambiental”, salienta. A Lei Federal nº 10.216/2001, Art. 2º, dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental.

No Brasil há poucos estudos abordando a temática de “acumuladores de animais”, sendo esse o que a motivou incluir a investigação na pesquisa feita em Maceió. O estudo foi realizado durante o Mestrado Profissional Pesquisas em Saúde (MPPS/Cesmac), com ênfase em saúde pública com caninos e felinos domésticos, sob a orientação do Prof. Dr. Sílvio Romero Oliveira de Abreu. Teve continuidade na Ufal com colaboração do Prof. Wagnner Porto, como aluna do Mestrado Acadêmico com ênfase em Medicina de Felinos.
A veterinária informa que como a conclusão da pesquisa apontou para a necessidade de política pública de educação ambiental para tutores de cães e gatos, foi desenvolvido como produto de utilidade pública os primeiros materiais educativos, identificados como Guias Educativos/cartões sanitários animal, já registrados na Biblioteca Nacional Brasileira e com selo ISBN, e disponíveis como utilidade pública no site do Conselho Regional de Medicina Veterinária (CRMV), de Alagoas. Com isso, o estudo está indo além da publicação dos resultados, apresentando soluções e com participação na construção de iniciativas no âmbito do legislativo federal e estadual (já em tramitação) e também municipal.

 
Legislação municipal
 
Existe em Maceió, desde 25 de setembro de 2003, uma lei em vigor que define a quantidade de animais (caninos e felinos domésticos) em residências. Consta na legislação municipal, no Art. 35: Não serão permitidos, em residência particular, a criação, o alojamento e a manutenção de mais de 10 animais, no total das espécies canina ou felina com idade superior a 90 dias. A lei municipal, no parágrafo 1º, esclarece “A criação, o alojamento e a manutenção de animais, em quantidade superior ao estabelecido neste artigo, caracterizará o canil de propriedade privada sujeito às penalidades legais pertinentes”.
Embora a legislação esteja em vigor há quase duas décadas, a médica veterinária diz que de modo geral, não há conhecimento por parte das pessoas e essa realidade é percebida até informalmente em conversas em consultório, durante as orientações preventivas para cuidados com animais. Em sua opinião, “a única forma de tornar o cidadão participativo nas regras criadas pelo legislativo, é fazê-lo conhecer as normas/leis e que o poder público direcione os esforços necessários a isso, bem como, definir estratégias que permitam ao cidadão cumprir o estabelecido legalmente”, conclui.
(Fonte: Ufal.br - https://bit.ly/32bebsM )